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Aline Araújo, especial para Panis & Circus

“La grenouille avait raison” (“A rã tinha razão”, em tradução livre), de James Thierrée, conduz o espectador a uma viagem fantástica ao mundo subterrâneo de seu criador. É um espetáculo que mistura circo contemporâneo, dança, teatro, mímica e música e encanta o público europeu.

 

Elenco de “A rã tinha razão”, de James Thierrée

 

Tive o prazer de assistir à produção no mês de janeiro, no espaço cultural Odyssud Blagnac, na região de Toulouse, na França. Em cartaz na Europa desde meados de 2016 e estrelado pela Compagnie du Hanneton, o mais recente espetáculo de James Thierrée prossegue em turnê pelo velho continente e garante uma bela experiência estética e sensorial a seus espectadores.

 

Retrato de Thierrée feito pelo fotógrafo Richard Thierée

 

“La grenouille avait raison” é o sexto espetáculo da carreira de James Thierrée, conhecido do grande público por sua atuação ao lado de Omar Sy em “Mr. Chocolat”. (Clique aqui e leia a reportagem do Panis & Circus: Mr. Chocolat: o clown negro da Belle Époque).

A explosão de criatividade na produção visual do espetáculo ficou a cargo da imaginação de James Thierrée e de sua mãe, Victoria Chaplin. (Victoria e Jean-Baptiste Thierrée, pais de James, são os criadores do “Le Cirque Invisible” – um circo de grande impacto visual. Clique aqui e leia a reportagem do Panis & Circus sobre “Le Cirque Invisible”).

 

Cenário de “A rã tinha razão” de James Thierrée / Foto Divulgação

 

Relembrar o parentesco de Thierrée com Charles Chaplin é pertinente para descrever alguns dos movimentos de “La grenouille avait raison”.

Em cena, não há falas, no entanto, há muitos diálogos. Começando pela personagem que acompanha a abertura das cortinas com seu canto cristalino, algo místico, e se envolve no tecido até desaparecer. Ela ressurge de tempos em tempos, marcando rupturas, e se fazendo presente pelo canto, como se fosse uma narradora que prescinde do enredo e alinhava os acontecimentos por meio da música. E, se não se pode falar em enredo nessa criação de Thierrée, é simplesmente porque não há maneira de construir uma narrativa que dê conta do que acontece no palco.

O espetáculo assemelha-se mais a uma sequência de quadros vibrantes em movimento do que à representação de uma história.

 

Thierrée e Doucet em “A rã tinha razão” / Foto Richard Haughton

 

Os diálogos continuam por meio da mímica, que Thierrée realiza com muita habilidade, demonstrando a influência de seu avô em sua carreira. Não há como não pensar em Carlitos no momento em que o mímico implica com o topete ou quando tenta se desvencilhar de um violino grudado nas mãos. Suas “conversas” com o comediante belga Jean-Luc Couchard, seu mordomo, arranca gargalhadas do público, que se diverte tanto quanto se surpreende durante a apresentação.

 

A máquina com plafonds e a escada helicoidal / Foto Richard Haugton

 

Motivo de mais aplausos é a performance da contorcionista Valérie Doucet, cujo corpo elástico não oferece limites nem resistência aos seus movimentos desconcertantes pelo palco, que variam de etéreos a convulsivos. Junto com a moça, o público prende a respiração na cena em que ela, submersa em um aquário retangular cheio de água, permanece imóvel por minutos que se arrastam.

 

O aquário observado por Valérie Doucet / Foto Richard Haugton

 

James Thierrée sobre o aquário e Valérie Doucet fazendo contorcionismo / Foto Richard Haugton

 

Há ainda outra artista, bailarina e acrobata, que garante a plasticidade das cenas, em uma dança aérea tão orgânica quanto poética, no alto de uma máquina que ocupa o centro do palco.

O cenário, aliás, é um espetáculo à parte.

 

A bailarina dançando no alto da máquina com plafonds / Foto Richard Haugthon

 

A iluminação, as cores e o aquário passam a sensação de umidade, condição natural da morada dos anfíbios.

Há uma máquina enorme, suspensa, de formato aracnídeo, e que tem vários plafonds móveis e iluminados distribuídos em sua extensão, proporcionando uma atmosfera subterrânea cheia de sombras. Ligando essa máquina ao aquário, há um cabo que brilha e parece conduzir eletricidade.

Servindo de apoio para belíssimas danças aéreas, ainda há uma escada helicoidal, que causa impacto desde a primeira cena, quando Thierrée surge descendo por ela. Encerrando a noite, aparecem no palco um grande equipamento parecido com um canhão, em que o artista gira vertiginosamente e, depois dele, uma enorme e surpreendente rã, branca e vaporosa, que tira o fôlego dos espectadores.

 

James Thierrée na escada helicoidal / Foto Richard Haughton

 

As ações se desenrolam nesse cenário fantasmagórico como pequenos mistérios feitos de movimento e música, reproduzindo um mundo onírico melancólico e, de certa forma, infantil. “La grenouille avait raison” encanta o público. Não busca ser compreendido, mas vivido, estética e emocionalmente; uma obra de arte, sem dúvida.

 

Atores em cena de “A rã tinha razão” / Foto Richard Haugton

 

Ficha Técnica
Diretor: James Thierrée
Elenco: James Thierrée, Valérie Doucet, Mariama, Jean-Luc Couchard, Samuel Dutertre, Thi Mai Nguyen
Cenografia e música: James Thierrée

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