Pular para conteúdo principal

.

 Mônica Rodrigues da Costa*

A atriz cômica circense Dani Rocha-Rosa lançou em uma live no final de outubro o e-book Kindle “Revelação – Teatro e Circo – Um Caso de Amor Transcendental” (Amazon, 2020), livro sobre os treinamentos de ser atriz e cômica circense. Não é manual, não funciona como obra de autoajuda nem traz listas de exercícios sistemáticos da forma tradicional. A autora quer que seja um livro de cabeceira de um ator ou um circense que deseja aprimorar seu fazer a partir do encontro com a própria identidade, em exercícios de respiração, postura e meditação sobre si mesmo e sua arte.

O livro se divide em capítulos ágeis, de escrita poética, como “Mergulho”, “Consciência e Aceitação” e “A Cena”, entre outros. A autora relata sua trajetória de quase três décadas como atriz de teatro e circo, conta como aprendeu e aprende a ser uma cômica circense, explica como dirige grupos de circo e teatro e como constrói uma personagem de ruptura com a própria arte que apresenta.

Todos os seus assuntos levam o leitor à intimidade do fazer estético. Há depoimentos e relatos de artistas amigos da autora sobre o aprendizado da interpretação e construção de números do picadeiro e sobre o trabalho de ator.

A autora conta que se perguntou algumas vezes “a serviço do que estava fazendo esse livro”. Como já foi professora e tinha por paixão fazer com que o aluno vivesse uma experiência concreta no processo de aprendizado, pensou na própria formação e tomou a decisão de escrever. “Os exercícios que escolhi mexem com a consciência, a gente estuda a alma humana e nesse decifrar dá-se o processo criativo, que é sempre avassalador”, afirma.

“Quick Change”, número de Dani, no Zanni / Foto Paulo Barbuto

Aprender com o circo traz a alegria de uma estética que mexe com o riso, a família e coisas que Dani declarou que não tinha com o teatro. “É uma experiência que me permito viver como atriz. A lona tem atrações, mas admiro no circo especialmente a anarquia, porque mostra a liberdade, há um lado do circo quase permitido socialmente, que é viver de forma anárquica em relação ao trabalho e isso ajuda o artista a criar.”

O livro expressa a busca da identidade, de conhecer a si mesmo. Para Dani, o trabalho da atriz é uma construção poética de dar forma ou expressão ao personagem: “São camadas energéticas de emoções e chega a um momento que você está vivendo o personagem”.

A arte de criar sonhos no circo-teatro fazendo mágica

O livro “Revelação – Teatro e Circo – Um Caso de Amor Transcendental” mostra a trajetória da Dani Rosa desde cenas de infância até o presente e relata as experiências de uma atriz, formada em Artes Dramáticas e diretora de teatro e circo, dançarina, cômica circense, dramaturga e professora.

No teatro, Dani atuou em peça do grupo Gattu, dirigido por Eloisa Vitz, como na montagem “Doroteia” (2009 a 2012 em cartaz), com texto de Nelson Rodrigues (1912-1980), entre outros espetáculos.

.

Equilíbrio com os bambolês no Zanni / Foto Fausto Franco 

.

Em 2014, Dani entrou no Zanni, o mais importante picadeiro experimental de São Paulo e possivelmente do Brasil que ao mesmo tempo mantém suas apresentações de picadeiro tradicional e tem um corpo de artistas com todos os membros das nove famílias da lona trabalhando juntas. No Zanni há números de música excêntrica, malabarismo, pratos chineses, piadas de palhaços, atrações aéreas – um de seus pontos fortes – e bailarinas que fazem coreografias de ciganas, sobem no tecido, montam uma centopeia dançarina e se equilibram no arame tenso.

Hoje é integrante do Circo Zanni e do Circo Amarillo e tem com Marcelo Lujan a companhia LaClass Excêntricos. Tem uma filha de cinco anos, Maia, com o companheiro, Lujan, multiartista que é sócio e diretor musical do Zanni. Em 2020 criou o programa semanal chamado “Quem Sou Eu? Mulheres Circenses 2020” no YouTube.

.

Marcelo Lujan e Dani Rocha-Rosa: espelhos em La Class Excêntricos / Foto Anna Kumamoto

.

Dani Rosa comenta seus procedimentos de artista do circo aproveitando os conhecimentos adquiridos em sua vida de atriz de teatro. Leia a seguir os destaques da conversa com o Panis & Circus.

Circo Zanni

“Cada espetáculo do Circo Zanni é uma celebração. Você vê sempre uma catarse acontecer dentro da lona e é poderosa. O Zanni é um lugar muito bacana de se trabalhar porque ao mesmo tempo tem uma contemporaneidade e uma vontade de se reinventar todo o tempo e isso para mim é o que importa.

Quando comecei a trabalhar nesse picadeiro, em 2014, nunca perguntei o que eu ia ganhar, mas o que eu poderia fazer, seja aprender uma música nova ou integrar um número cômico.

Fui para o Zanni quando me casei com Marcelo [Lujan], foi uma oportunidade, pois circo é sempre um pacote familiar.”

Números  no picadeiro

“Comecei no Circo Zanni com uma aproximação com os palhaços, com os quais eu me identificava mais e passei a incorporar os erros de ensaio como parte dos números que apresento. Com as mulheres do Zanni me integrei porque é um ato de revolução dançar as ciganas com as meninas e estar junto no canto ou lá em cima, na lira.”

Nos meus números a virtuose vai por água abaixo. O Quick Change, meu primeiro no Zanni, que Domingos Montagner (1962-2016) dirigiu, é um número de troca de roupas. O meu cada vez fica mais cômico e vou integrando os erros, as pessoas dão risada porque dá tudo errado.”

.

Maia, filha de Dani e Lujan no Zanni/Foto de Paulo Barbuto

.

Filha de artistas

E Maia, sua filha de cinco anos, no circo? Dani respondeu: “O circo combina com criança, a brincadeira da acrobacia tem a ver com a infância. Maia tem um grande presente, a vida que ela leva com a brincadeira do circo, mas não sei se escolherá isso na vida, sempre achei que ser artista era uma ótima opção, mas ela pode escolher o que quiser, é de cada um como a gente quer se expressar na vida.”

Arte e política

“Como cômica no circo, não faço política no meu trabalho, mas tenho um trabalho político sutil. Estar em um palco com outras mulheres em cena é um ato político.”

Mulheres

“Quando entrou a pandemia me perguntei o que fazer. Como sou uma mulher circense e sei elogiar as mulheres convidei-as para contar em meu canal no YouTube sua arte, seus projetos e como se sentem no mundo. Gosto de trabalhar com mulheres. De cada mulher eu vejo a criança dela, desde criança sou assim e resolvi elogiar a mulherada no circo.

Quando fui pro circo, eu olhava as mulheres acrobatas e achava que não era pra mim, ‘meu corpo não faz isso’, então comecei a provar coisas que eu considerava circenses em mim e daí ocorreu o meu mergulho para buscar a minha própria dramaturgia, que tem a ver com o livro, que tem a ver com os processos que eu passei pra entender a minha identidade circense.”

“A Serpente” no teatro

“Conheci Marcelo por causa do espetáculo que estávamos  montando naquele momento, “A Serpente” (2011), de Nelson Rodrigues, desejávamos como treinamento físico uma técnica que trabalhasse o equilíbrio. Assim cheguei até Marcelo, equilibrista de cabo tenso (que muitos confundem com corda bamba), que começou a treinar o grupo. Andei em uma barra a uma altura de 2,5 metros do chão.” 

.

Dani Rocha, Rhena de Faria e Marcelo Lujan em “Circo Excêntrico / Foto Asa Campos

   .

O ator no circo

“O circo tem esse lugar de trazer a virtuose do próprio humano, de quem a pessoa é, e claro, existe no circo uma dramaturgia das formas, ou seja, você estuda uma sequência acrobática, escolhe uma música que te atraia, um figurino bonito e faz uma sequência linda, uma partitura física bonita que as pessoas vão amar, mas no meu caso, que venho de uma formação teatral, e não consigo criar sem pensar no papel que tenho no mundo, fui pra um lugar profundo de investigação que é mais próximo dos palhaços, dos cômicos, e quando cheguei perto dos palhaços percebi que eu não tinha nada a ver com aqueles palhaços, mas tinha uma loucura que nos unia.”

.

Fernando Sampaio e Dani Rocha-Rosa em Sonâmbula/Foto Paulo Barbuto

.

As fotos dessa reportagem fazem parte do livro “Revelação – Teatro e Circo – Um caso de Amor Transcendental” 

Serviço

Livro disponível na Amazon, clicando aqui.

*Mônica Rodrigues da Costa é jornalista, crítica, poeta e escritora, professora da graduação de Jornalismo na FAAP e do pós-graduação da PUC em São Paulo.

Deixe um comentários